13 de setembro de 2008

Dossiê Drink Drinker: O Martini do James Bond!

Muito se fala - inclusive nesse blog - sobre a relação entre o personagem ficcional James Bond e o famoso cocktail Dry Martini. Nossa reportagem decidiu tirar isso a limpo e encontrar, na obra original do escritor Ian Flemming, a verdadeira origem dessa mitológica relação.

No primeiro livro da série, Casino Royale, Bond pede um Martini ao barman do cassino (tradução minha):
- Um dry martini. - disse Bond. - Um. Em um cálice fundo de champanhe.

- Oui, monsieur.

- Espere. Três medidas de Gordon's, uma de vodka, e meia medida de Kina Lillet. Agite até ficar bem gelado, depois acrescente uma carca de limão bem fina e comprida. Entendeu?

- Certamente, monsieur. O barman parecia feliz com a sugestão.

- Puxa, isso é o que eu chamo de drink. - disse Leiter.

Bond riu.

- Quando eu estou... ahn... me concentrando, - explicou, - eu nunca tomo mais do que um drink antes do jantar. Mas eu gosto que ele seja grande e bem forte, e muito gelado e muito bem feito. Eu odeio porções pequenas de qualquer coisa, especialmente quando elas são ruins. Esse drink é uma invenção minha. Vou patenteá-lo assim que eu conseguir pensar em um bom nome.
Mais tarde, Bond batizou seu drink de Vesper, que é o nome de seu "interesse romântico" no livro.

Kina Lillet é um aperitivo de vinho branco feito em Podensac, uma cidadezinha da região de Bordeaux, na França. Ele tinha um sabor amargo porque continha quinino (daí o nome Kina), mas a quantidade de quinino da receita original foi reduzida em 1986. No entanto, a bebida existe até hoje no mercado estrangeiro.

Drink Drinker experimenta: Gin

Ao longo de minha carreira de bêbado ilustre (o antônimo de alcoólatra anônimo), já experimentei várias marcas de gin, que se tornou uma de minhas bebidas favoritas de todos os tempos. Gostaria de compartilhar com os amigos leitores as minhas experiências pessoais com as marcas de gin disponíveis no nosso querido e alcoolicamente despreparado Brasil.

Existem basicamente três faixas de preços de gin no Brasil: Gin Importado, Gin Nacional, e Gin de Brincadeira.

Os Gins de Brincadeira são aqueles que custam menos de 10 reais, como Rocks e Asteca. Assim como as vodkas de 10 reais, nenhum deles merece confiança, e recomendo a todos que preservem seus cérebros e fígados evitando bebidas de qualidade duvidosa. Como diria o Ministro das Minas e Energia, "álcool é um assunto muito sério".

Na faixa dos 20 reais temos duas marcas de gin nacional: uma boa e uma ruim. Todo mundo que eu conheço que bebe gin concorda com esse assunto: o Seager's é ruim (i.e. sabor amargo, desce queimando, dá ressaca e dor-de-cabeça no dia seguinte) e o Gilbey's é bom (não é tão bom quanto os importados, mas não apresenta nenhum dos problemas acima mencionados). Infelizmente, a grande maioria dos bares só compra gin da marca Seager's, sei lá por que diabos. Provavelmente porque ele custa mais caro do que o Gilbey's. Parece loucura mas é verdade. Como 99,999% dos donos de bar e gerentes de restaurante não bebem gin, eles compram meio que por obrigação - quando compram - e na dúvida de qual marca escolher acabam pegando a mais cara pensando que deve ser melhor. Pois não é. Eu nunca conheci ninguém que gostasse mais de Seager's do que de Gilbey's. O Gilbey's é a Smirnoff do gin - melhor relação custo-benefício que tá tendo. UPDATE: infelizmente o gin Gilbey's desapareceu do mercado nacional. Se você quiser fazer uma receita que leve gin, e estiver sem grana para comprar um importado, a melhor opção é o STEINHAEGER BECOSA. Steinhaeger nada mais é do que um tipo de gin, e o Becosa é bem seguro, desce suave, pode substituir sem susto.
Agora, na faixa de preço um pouquinho mais dolorosa, as coisas começam a ficar realmente boas. Eu poderia passar a vida toda bebendo Gin Tônica de Gilbey's, mas depois que conheci essas belezuras importadas, minha vida mudou para melhor.

Muito melhor.

Dei uma pesquisada no site da Imigrantes Bebidas e encontrei as seguintes marcas disponíveis (todas em garrafas de 750 ml):
  • Gordon's (R$71,99)
  • Tanqueray (R$80,99)
  • Beefeater (R$87,99)
  • Bombay Sapphire (R$94,99)
Dizer que um deles é melhor do que os outros seria me pedir para matar um filho para salvar os outros três. Mas uma coisa eu posso garantir: se depois de beber um drink feito com qualquer um dos quatro você continuar achando que gin parece perfume, é porque sua língua está estragada. Para falar a verdade, eu gosto tanto de gin que eu nem compro mais perfume. Quando preciso ir a algum evento que exige uma perfumada no cangote, saco minha garrafa de Bombay ou de Gordon's e passo um pouquinho nos punhos e atrás das orelhas. Não falha nunca.

O complicado de resenhar gin é que o sabor é tão intenso e complexo que fica difícil de explicar com palavras. Já vi gente dizer que não gosta do Beefeater porque ele é burocrático demais. Já vi gente dizer que o Gordon's é um gin confiante. No final, parece que você está falando não de bebidas, mas de velhos amigos.

Pensando melhor, talvez você esteja mesmo.

crédito da foto: pinballrebel.com

Gin - O Crack Engarrafado!

Quando você pede um drink com gin em um bar ou restaurante do Brasil, os comentários mais comuns que você ouve são os seguintes:

- Gin é o último estágio do alcoolismo!
- Gin tem gosto de perfume!
- Gin é bebida de velho!

Esses comentários fazem parte do inconsciente coletivo, e quase todo mundo os têm na ponta da língua, não demonstrando pudor algum em dispará-los contra o pobre e inocente bebedor de gin, e sem demonstrar ao menos uma ponta de curiosidade. No entanto, depois de ser agraciado com uma amostra do mais puro gin London dry, a pessoa nunca mais volta atrás: eu nunca ouvi falar de um ex-bebedor de gin. Além do mais, todo alcoólatra que eu conheci na minha vida só bebia cerveja nacional, perfume é uma coisa muito cheirosa, e coisas de velho sempre são mais legais do que coisas de jovem - como, por exemplo, as bebidas, as gírias, as roupas, e as músicas.

Vou contar agora a pequena história dessa misteriosa bebida, para nos ajudar a compreender melhor o seu valor.

Tudo começou na Holanda, por volta do século XVII, quando o médico e cientista alemão Franciscus Sylvius começou a desenvolver um remédio para curar doenças do aparelho digestivo como lumbago, problemas de fígado e coisas do gênero. O remédio, feito à base de álcool de grãos e uma frutinha chamada zimbro, logo se espalhou pelas farmácias de toda a Amsterdã e região.

Em 1688, ocorreu na Inglaterra a Revolução Gloriosa, que destronou o rei James II e o substituiu pelo holandês Guilherme de Nassau e Orange, que tornou-se então o rei James III da Inglaterra, Irlanda e Escócia. Após sua ascensão ao trono, seguiu-se um período de abertura de mercado para produtos holandeses, e então o remédio do Dr. Sylvius passou a ser consumido na boa e velha Albion.

Esse remédio/bebida era até então conhecido como "jenever", por causa da palavra francesa para zimbro (foto), que é "genévrier". Até hoje, na Holanda, produz-se o jenever, com álcool de centeio e zimbro, e envelhecido em tonéis de madeira, o que deixa a bebida com um colorido semelhante ao do uísque escocês. Sua graduação alcoólica é relativamente baixa, e o sabor é bem diferente do gin como o conhecemos hoje em dia.

Quando o jenever começou a se popularizar na Inglaterra, o governo liberou sua produção e impôs altas taxas de importação para destilados de origem estrangeira. A idéia era incentivar a economia local, e também criar uma utilidade para o cereal de baixa qualidade que não servisse para fazer cerveja. Por volta de 1740, a produção de jenever na Inglaterra já era seis vezes maior do que a de cerveja, e o baixo custo da bebida fez dela a favorita das classes mais desfavorecidas.

Nessa época, haviam em Londres mais de 15.000 casas de bebida, e mais da metade delas vendia gin. Foi então que surgiu a péssima fama do gin: mergulhados em depressão e miséria, os pobres londrinos começaram a se afogar no gin, em bares que anunciavam "1 centavo para ficar bem, 2 centavos para ficar ótimo, com 3 centavos você desmaia" e ofereciam camas de palha para os clientes caírem com conforto. Desde essa época, até hoje os ingleses chamam os bêbados de "gin-soaked", e se referem ao gin como "Mother's Ruin" (Ruína de Mãe).

Em 1751, o artista inglês William Hogarth fez duas gravuras retratando essa situação, chamadas "Beer Street" e "Gin Lane". Essa é a gravura "Gin Lane":

Ela era acompanhada do seguinte poema, tradução minha:

Gin, cursed Fiend, with Fury fraught,
Makes human Race a Prey.
It enters by a deadly Draught
And steals our Life away.

Virtue and Truth, driv'n to Despair
Its Rage compells to fly,
But cherishes with hellish Care
Theft, Murder, Perjury.

Damned Cup! that on the Vitals preys
That liquid Fire contains,
Which Madness to the heart conveys,
And rolls it thro' the Veins.

(Gin, monstro amaldiçoado, com apavorante força, faz da Raça Humana sua presa. Ele entra na forma de uma bebida mortal, e leva sua vida embora. Virtude e Verdade são levadas ao desespero, empurradas para o céu por sua fúria; mas ele nutre com cuidado infernal o Roubo, o Assassinato e a Mentira. Maldito copo!, que preda as energias vitais. Esse líquido contém Fogo, que Loucuras leva ao coração, e as faz passar pelas veias.)
Depois de tanto estardalhaço, não é de espantar que o gin tivesse se tornado o bode expiatório de todas as mazelas sociais da Inglaterra. Apesar de não ser culpado pela pobreza daquele país, o Governo colocou nele a culpa de tanta tragédia, impondo leis e impostos proibitivos que quase interromperam sua produção. Isso deu origem a revoltas populares nas ruas, no que ficou conhecido como "A Revolta do Gin".

Logo após esses levantes, o governo começou a diminuir as restrições, e fez o que deveria ter feito desde o começo: restringiu a produção da bebida aos estabelecimentos que cumprissem determinadas regras de produção, e colocou as "gin shops" sub a jurisdição dos magistrados. Isso também minimizou a principal causa dos problemas causados pelo gin naquele período: a péssima qualidade das bebidas produzidas.

Sem a obrigação de seguir nenhuma espécie de regulamentação ou leis, os produtores de gin criavam as misturas mais estapafúrdias para suprir a demanda crescente por bebidas fortes e baratas. Para obter um sabor levemente semelhante ao do jenever original, misturavam terebentina e outros solventes com água não-tratada e impurezas de todo tipo, criando verdadeiras bombas tóxicas na forma de bebida. A ingestão de solventes e produtos químicos pode trazer vários efeitos colaterais, entre eles a cegueira e a loucura. Por isso não é à toa que os bebedores de gin faziam tanta confusão e tragédia: não era o zimbro que provocava isso em suas mentes, mas sim a terebentina e outras porcarias que eles ingeriam pensando que era gin.

Levou muito tempo para que esse estigma da bebida destruidora de sociedades abandonasse o gin (se é que abandonou, como comprovam os comentários preconceituosos que ouvimos até hoje). A invenção das Colunas de Destilação em 1826 revolucionou a produção de álcool em todo o mundo, o que levou à criação de uma variação mais refinadas do gin.

No final do século XIX, já havia sido criado o London Dry Gin, que é essa bebida que chamamos de gin hoje em dia. Diferente de seu antepassado jenever, o gin londrino é transparente, tem um teor alcoólico mais alto (por volta de 38 graus, assim como a vodka) e não é envelhecido em tonéis de madeira. Essa nova bebida tornou-se socialmente aceitável, e passou a ser vendida em lojas mais elegantes do que as gin shops de outrora. Nascia assim um dos destilados mais importantes do mundo das bebidas, que logo se espalhou por todo o mundo.

As colônias inglesas foram logo invadidas pela novidade, e o gin passou a ser consumido em países tão distantes quanto a Índia, o Egito e a Jamaica. Foi nos países tropicais que os colonizadores ingleses tiveram a brilhante idéia de usar o gin para deixar mais agradável o amarguíssimo remédio que precisavam tomar para se prevenir da malária. Diluído em água carbonatada, o quinino deu origem à água tônica, que acrescida de gin e limão veio a se tornar um dos drinks mais clássicos e tradicionais do mundo: o Gin-Tônica.

Outro drink de gin que ficou famoso no mundo inteiro, graças aos filmes de James Bond, é o Martini, uma bebida sofisticada feita com gin puro acrescido de uma pequena quantidade de Vermute.

Para maiores informações, você pode visitar o Museu Nacional do Gin, na cidade de Hasselt, Bélgica.

The Champs - Too Much Tequila

Obrigado a todos que têm postado comentários, é muito importante para mim saber o que vocês querem saber! O post sobre tequila ainda vai demorar um pouco, mas por enquanto podem ir se divertindo com esse pequeno vídeo!

Até mais!